Resumo
Análise jurídica da interrupção da gravidez em caso de anencefalia face á propositura da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54, ajuizada no Supremo Tribunal Federal, em 2004 pela CNTS. A anencefalia é uma má-formação que ocorre no fechamento do tubo neural. Em virtude disso, não há cérebro bem constituído no anencéfalo, motivo pelo qual a expectativa de vida dessas crianças é muito curta. Muitas mães, grávidas de anencéfalos, pleiteiam autorização judicial a fim de interromperem a gravidez, alegando a inviabilidade do feto. A diversidade de decisões judiciais nesses casos, e a consequente insegurança jurídica, motivaram a CNTS a ajuizar a ADPF 54, visando à chamada “antecipação terapêutica do parto em caso de anencefalia”. A ação foi distribuída ao Ministro Relator Marco Aurélio, e a decisão da ADPF 54 terá eficácia erga omnes e efeitos vinculantes. Sabe-se que o Código Penal Brasileiro não autoriza o aborto em caso de anencefalia. Porém, uma interpretação sistemática, teleológica e evolutiva das normas vigentes aponta para a não punição da mãe que decide pelo aborto. Afirma-se, também, a inexistência de crime, comparando o anencéfalo a um natimorto cerebral. Além disso, a dignidade da mãe e a inexigibilidade de conduta diversa justificariam a “antecipação do parto”. Por outro lado, a Constituição de 1988 (art. 5º) garante a inviolabilidade do direito à vida, independente de sua viabilidade. O Código Civil, de 2002 (art.2º), garante os direitos do nascituro desde a concepção. A convenção Americana sobre Direitos Humanos dispõe que o direito á vida está garantido desde a concepção. O Preâmbulo da Convenção sobre os Direitos da Criança diz que a proteção legal à criança se dá tanto antes, como depois de seu nascimento. E o Código Penal tipifica o aborto como crime contra a vida e contra a pessoa. Concluí-se daí, a complexidade do tema. Não obstante os impedimentos constitucionais, percebe-se a tendência do STF autorizar o aborto em caso de anencefalia, em claro desrespeito ao princípio da separação dos poderes.